A HISTÓRIA DE "MAS QUE NADA": afrossamba-rock de terreiro

Jorge Ben por Albery em 1969

Não havia ninguém que fizesse algo parecido com o som que Jorge Ben tirava do violão no Brasil do início dos anos 1960. 

Não havia dedilhados. Ele marcava o ritmo batendo nas cordas. Como se fosse uma guitarra de folk, mas com uma levada que lembrava o samba. Era diferente. Uma mistura.

Como ele mesmo

O menino nasceu Jorge Duílio Ben Zabella Lima de Menezes. Filho do estivador Augusto de Menezes com a imigrante etíope Sílvia Lenheira Ben Zambella.

Criado no bairro carioca do Rio Comprido, aprendeu a tocar pandeiro com 13 anos. Começou a cantar na mesma época em coral de igreja, onde também aprendeu a dominar outros instrumentos. 


Arte com a discografia de Jorge publicada pela Revista Trip

Amava música e gostava de ouvir de tudo: de João Gilberto a Luiz Gonzaga, mas também estava atento ao rockn roll. 

Já era dono de um espírito livre, disposto a experimentar muita coisa na vida. Considerou até ser médico pediatra ou advogado. Mas uma carreira no time do coração, o Flamengo, parecia mais próxima. Chegou a treinar na Gávea. Uma contusão no tornozelo deixou o sujeito fora dos gramados e dentro de casa.  

Passou mais tempo com o violão que ganhara da mãe e foi aí que descobriu seu destino na terra.  Nem medicina, nem o direito, nem bola. O lance dele era com a música. Adeus, Jorge Duílio. 

Bem vindo, Jorge Ben.

Essa vida misturada dele acabou gerando um artista com uma percepção privilegiada, própria de quem não se fechava a nada e que desejava ir além.

Ele era assim. Até pra tocar violão. Como seu ídolo João Gilberto, que inventara a batida da Bossa Nova, Jorge também inovou. 


Jorge e seu violão: revolução sonora

Em entrevista à Revista Raça, em 1998, ele disse que foi influenciado pelo compositor Luís Carlos Paraná, que lhe ensinou a afinação estilo viola caipira.

Esse talento levou o jovem ao famoso Beco das Garrafas, um dos redutos da Bossa Nova no Rio. Lá ele teve contato com os melhores músicos da época. Dali saiu pra gravar um compacto simples com duas músicas, compostas por ele, com arranjos do  maestro João Theodoro Meirelles e o grupo Copa 5. 

As canções escolhidas: Por causa de Você, Menina e uma certa Mas Que Nada.

Era samba, música nascida nos guetos do Brasil, mas ele fazia questão de marcar posição: continha misturas. Era também um pouco jazz, que tem as mesmas raízes negras. Pelos parentes por parte de mãe, foi apresentado aos sons da África. Os tambores do maracatu e do jongo marcaram sua juventude e foram parar nas canções que compunha. 

Tudo isso aparece na letra e nos arranjos do primeiro grande sucesso de Jorge.  

Mas Que Nada começa em dialeto africano iorubá: O'ariá Raiô Obá é uma saudação a Obá, deusa guerreira do Candomblé. Como se pedisse força e bênção, para que todos pudessem usufruir da musicalidade que une continentes.


Ooooo'ariá raiô
Obá, Obá, Obá (2x)

Mas que nada
Sai da minha frente 
Eu quero passar
Pois samba está animado
Que eu quero é sambar
E esse samba 
Que é misto de maracatu
É samba de preto velho
Samba de preto tu
Mas que nada
Um samba como esse, tão legal
Você não vai querer 
Que eu chegue no final

O compacto foi um sucesso. 

Rendeu a Jorge o primeiro disco solo chamado Samba Esquema Novo (1963).



Chamou a atenção de muita gente boa - como o Tamba Trio, que também gravou Mas Que Nada.


Jorge foi convidado para uma turnê de três meses pelos Estados Unidos. Lá, o maestro e arranjador brasileiro Sérgio Mendes gravaria uma versão inesquecível da música com a Banda Brasil 66.


Ertha Kitt, a Mulher Gato da série do Batman, apresenta o programa com Sérgio Mendes e Brasil 66

Essa gravação fez Mas Que Nada uma das canções brasileiras mais conhecidas no mundo, ao lado de Garota de Ipanema. Já foi interpretada por grandes nomes como Ella Fitzgerald, Trini Lopez e Jose Feliciano.

Quarenta anos depois, a versão do maestro ganhou nova roupagem num remix em parceria de Mendes com o grupo pop estadunidense Black Eyed Peas. 



Pesquisa: Robson Leite

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