A HISTÓRIA DE "OUTRA VEZ": Dores de amores

Isolda e Roberto Carlos em setembro de 2018: parcerias eternas

A primavera de 2018 parte levando embora Isolda Bourdot. O coração, que tantas vezes impulsionou sua poesia, cismou de parar.  Mas ele permanece batendo forte em canções que marcaram idas e vindas de vários amores, ao longo de décadas de composições. Músicas que abasteceram os repertório de ícones românticos da MPB como Wando, Agnaldo Rayol e Ângela Maria. 

Foi um grande sucesso na voz de Roberto Carlos que garantiu um lugar de honra para ela na memória do público. A canção é Outra Vez, de 1977.  


Você foi o maior dos meus casos
De todos os abraços
O que eu nunca esqueci
Você foi, dos amores que eu tive
O mais complicado e o mais simples pra mim

Você foi o melhor dos meus erros
A mais estranha história
Que alguém já escreveu
E é por essas e outras
Que a minha saudade faz lembrar
De tudo outra vez....

Você foi
A mentira sincera
Brincadeira mais séria que me aconteceu
Você foi
O caso mais antigo
O amor mais amigo que me apareceu




Das lembranças que eu trago na vida
Você é a saudade que eu gosto de ter
Só assim sinto você bem perto de mim
Outra vez

Esqueci de tentar te esquecer
Resolvi te querer por querer
Decidi te lembrar quantas vezes eu tenha vontade
Sem nada perder

Você foi
Toda a felicidade
Você foi a maldade que só me fez bem
Você foi
O melhor dos meus planos
E o maior dos enganos que eu pude fazer

Das lembranças que eu trago na vida
Você é a saudade que eu gosto de ter
Só assim sinto você bem perto de mim
Outra vez

Isolda compôs a letra aos 20 anos de idade, logo depois de uma tragédia. 

Recém perdera o irmão Milton Carlos, sete anos mais velho, parceiro de vida e arte. Ele morreu num acidente de automóvel em 1976 na Via-Anhanguera em São Paulo. A dupla, que apareceu no cenário artístico graças a participações em festivais de música em MG, RJ e SP, tinha músicas de relativo sucesso já gravadas por Roberto Carlos, como Amigos, Amigos e Esse Jeito Estúpido de Te Amar

Isolda e o irmão Milton

Pouco tempo depois de perder o irmão, Isolda resolveu colocar algumas composições inéditas da dupla em uma fita-demo e mandar para Roberto. Outra Vez era a única que fizera sozinha. E foi a que o Rei gostou e gravou. Foi difícil de acreditar. No princípio, Isolda imaginou que tinha sido por pena.

- Com sinceridade, eu mandei essa música para o Roberto Carlos ouvir apenas porque havia sobrado espaço na fita. - revelou em 1998 em entrevista ao site Um Milhão de Amigos, de fãs de Roberto Carlos - Conhecendo bem Roberto Carlos, confesso que na época pensei que ele só tinha gravado para me ajudar por causa da morte do meu irmão. Eu não conhecia ninguém no meio artístico; quem agitava tudo, ia atrás dos compositores levando nossas músicas, era o Milton Carlos. Com sua morte, eu tive que começar a fazer essas coisas e isso não foi nada fácil. Por isso imaginei que Roberto havia gravado por amizade - concluiu.

De acordo com Paulo César Araújo no livro Roberto Carlos em Detalhes, a  letra surgiu de um bate-papo entre amigas:
 
Lá pelas tantas, as meninas começaram a falar sobre ex-namorados. “Qual foi o maior caso de amor de sua vida?”, perguntou uma delas para Isolda. “Quer mesmo saber? Foi o meu primeiro namorado, o Nilson”, respondeu. Uma outra amiga, que conhecia o caso, provocou: “Se fosse, você já teria telefonado pra ele. Você está solteira e guarda o número dele há muito tempo na sua bolsa. Por que não liga?”. De fato, desde que o namoro dos dois terminara, havia sete anos, eles não mais se haviam falado. Ao longo desse tempo, Isolda casou, descasou e teve dois filhos. Agora estava solteira, e o que teria acontecido com Nilson?

Pois Isolda apostou com a amiga que tinha coragem de ligar sim. E que ligaria naquele momento do telefone do bar. Isolda ligou, mesmo já tendo passado da meia-noite. O próprio Nilson atendeu e, quando quis saber quem estava falando, Isolda respondeu com outra pergunta: “Qual foi o seu caso mais complicado?”. Nilson não pensou um segundo para responder: “Isolda! Caramba, há quanto tempo!”


O resto é história.

Com mais de 400 composições em 20 anos de carreira, Isolda lançou em 2007 o livro Você Também Faz Músicas, em que dá orientações a iniciantes.

No mesmo ano, a música voltou aos ouvidos do público pela DPZ de Washington Olivetto. Foi o tema do retorno de Carlos Moreno ao papel de garoto propaganda da Bombril após um hiato de três anos.  




Em 2008, Outra Vez fez parte da trilha sonora do filme Meu Nome Não é Johnny - interpretada pelo próprio Selton Mello.



Outra Vez foi regravada em inúmeras ocasiões e por artistas do calibre de Altemar Dutra, Simone, Emílio Santiago, Gal Costa e Maria Bethânia. No exterior, pela orquestra de Ray Conniff (Once again), pelo cantor Pepino di Capri (Ancora Con Te) e ainda por Armando Manzanero (Usted Fué), compositor de quem Isolda tornou-se parceira mais tarde. 

 Pepino di Capri


Ela sempre dizia que as letras que compôs surgiram de histórias reais. Pode-se concluir, lendo e interpretando cada uma, que ela viveu intensamente e que amou demais nesses 61 anos de estada entre nós. Oxalá o coração dela, que apanhou muito ao longo da vida, possa agora descansar em paz.

Isolda permanece eterna e intensa na obra que construiu.



Pesquisa: Robson Leite
Referência: Blog Qual Delas

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